sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Ciclo das flores

É preciso abrir as janelas nas manhãs de primavera e permitir a entrada do sol. Amarelos campos brilhantes serão formados e tudo o que pode ser tocado será revestido pela leveza dos raios. É preciso se banhar com a chuva e apreciá-la para, então, receber de braços abertos a beleza do arco-íris. É necessário mudar a alma de casa, permitir a entrada do outro, deixando-o livre para partir quando quiser. Vai-se corpo, mantém-se a essência e os laços inquebráveis de irmandades costuradas a mão. Vestígios inabaláveis do que nunca foi físico... cheiros familiares, e ao mesmo tempo inéditos, apresentam suas distintas coreografias nas ruas pode onde passo. Memórias e saudades de fatos inexistentes são sementes que geram frutos da imaginação. Capítulos futuros e inacabados da vida colocam-se num cenário paradoxal, onde a lua do meio-dia não brilha e o sol da meia-noite reluz. Flores do campo nascem do asfalto, lagartas não descasulam e os gatos latem. A cabeça vive no chão e os pés nas nuvens, buscando pisar nos colchões de algodão construídos pela dinvidade para abrigarem anjos que, outrora terrestes, hoje são - ou estão - celestes. Meu coração se divide, gera pedaços que criam pernas e desfilam pelas calçadas... batem nas portas alheias e mantêm a porta do coração regenerado aberta. O músculo involuntário infla até com hospedagens efêmeras porque o tempo é pó na avenida do aprendizado que, no cruzamento adiante, encontra a do crescimento. As portas fechadas, por vezes, esvaziam o coração, mas não importa: ao encontrar ambientes hospedeiros arejados e espelháveis, me atrevo a pular os muros e abrir ao menos as janelas. A primavera e seu trajeto se invertem: transitam de dentro para fora! O tempo que lá era pó, aqui é oxigênio: mantém o ciclo das flores em pé, medindo frações de segundo para deixar este mundo florido. Os sóis das manhãs de outubro, tão únicos e iguais, insistem em deixar sempre o mesmo aviso: as andanças da alma ainda transformarão meu mundo numa eterna primavera.